terça-feira, 24 de maio de 2011

Como num passe de mágica: a música



Joaquim Ramos França tem a capacidade de com um simples gesto fazer surgir música. Basta um leve meneio de mão para que sinfonias e concertos brotem no ambiente. Violinistas, violoncelistas e flautistas obedecem-no como uma ordem imperiosa. Sua profissão envolve mistério e magia. Joaquim é maestro.

Nascido em 1962 no Macapá, Amapá, Joaquim desde criança sonhou tornar-se maestro. Não havia outra coisa que pudesse fazer para o resto da vida. A música apareceu pela primeira vez aos 13 anos, quando integrou uma banda local. Mesmo sem conhecer nada de técnica musical, aprendeu a tocar todos os instrumentos. Trompete, trompa, trombone, percussão e flauta. Experimentava, testava e, se agradasse ao ouvido, continuava. Logo depois, aos 17 anos, tornou-se regente da mesma banda, cargo que ocupou por 10 anos.

Brasília surgiu na vida do músico amapaense no momento de escolher a faculdade para se graduar. Já tinha longa experiência musical, mas queria ter diploma. Escolheu a capital do país sem saber bem o por quê. Místico, diz que foi o destino. Em 1988, mudou-se definitivamente para Brasília, onde se formou em regência pela Universidade de Brasília (UnB).

Fez de tudo um pouco na música, desde então. Tocou em bailes, festas, regeu orquestras do Brasil, escreveu arranjos para televisão. Foi regente titular da Orquestra Filarmônica de Brasília ao longo de quatorze anos. Em 2005, tornou-se maestro assistente da Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional Cláudio Santoro (OSTNCS). Era a oportunidade de investir na carreira de maestro de uma grande orquestra. Um sonho. A desilusão viria no ano seguinte.

A politicagem da vida de maestro das grandes orquestras oprimiu-o. Passou a administrar os egos inflados dos músicos em lugar de preocupar simplesmente com a música. “Para ser um maestro famoso, é preciso fazer a imagem, ficar perto de políticos, ter estômago para suportar certas situações dos músicos”, conta. Tempos depois, deixou a OSTNCS.

A vida de maestro envolve glamour e respeito. Mas o maior prazer está em sensibilizar, emocionar as pessoas. A força sobrenatural da música. A imagem que se tem da profissão é a de um seleto grupo de escolhidos e iluminados, que, pela música, fazem a realidade mais bela. No entanto, nem tudo é assim: reger é bastante árduo. Sem contar que é estar sempre à vista como uma vitrine. “Um caixa de banco pode errar e ficar anônimo, o maestro não”, compara.

Em quase 30 anos de ofício, Joaquim já reconheceu quais são os ganhos e as perdas de ser maestro. Tira-se a profissão do céu, põe-se na terra. Ser maestro também envolve solidão. A música que junta e agrega as pessoas é estudada sistematicamente em reclusão por muito tempo. O que toma meses de dedicação desaparece em poucos minutos. Passa-se muito tempo só, escutando a si mesmo e sons rabiscados no papel. É a essência vil da música.

Em 2006, quando ainda era maestro assistente da OSTNCS e tinha como amigo o falecido maestro Sílvio Barbato, regeu na sala Villa-Lobos um concerto didático para crianças.  A reação maravilhada delas emocionou-o e ele resolveu dedicar-se ao ensino para crianças.

Quando não está na Escola de Música de Brasília (EMB), lecionando harmonia e arranjo musical ou regendo a orquestra da escola, Joaquim está em casa escrevendo arranjos. A vida é trabalhosa pela manhã, pela tarde e pela noite. Nos tempos livres, cantarola canções para a esposa e tenta ensinar ao filho pequeno um pouco da arte de, como num passe de mágica, fazer surgir música com apenas um gesto de mão.


por Lucas Cajueiro

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